Saudações, aprendizes! Hoje tem conto novo! E com música! Explicações no fim do post...
Cavaleiro Negro
A neblina ainda era densa, de forma que o sereno fazia bem o seu trabalho
deixando tudo com aquela umidade irritante do início da manhã. Não que o povo
daquele vilarejo em especial fosse dado a reclamações. Muito pelo contrário: em
condições normais, os lenhadores já estariam fazendo seu trabalho desde a
primeira luz.
Mas
não era um dia como os outros. Os lenhadores não estavam no bosque. Um estava,
na verdade. E portando seu velho, porém afiado, machado.
Mas
não estava a trabalho.
-
Rápido! – Estendeu a mão para a mulher depois de abrir caminho, com um golpe,
por entre a vegetação.
Corriam
o mais rápido que podiam, tentando deixar o vilarejo para trás. Não pensavam em
nada: era apenas seguir em frente. Mas era difícil esquecer o fogo e o sangue.
O
massacre que presenciaram havia deixado sua marca nos dois.
Com
sorte, se distanciariam ao máximo e se esconderiam. Crag esperava que fossem
ignorados.
O
bosque se abriu num breve descampado para depois desbarrancar às margens do
rio. Poderiam atravessar por ali devido à seca dos últimos meses.
Um pouco de sorte, pensou
Anekke. Afinal, seria o fim da linha se tivessem encontrado o poderoso rio de
outrora.
Abaixaram-se
para beber um pouco d’água. Estavam exaustos, e Crag ainda mancava de leve.
Mas
estavam perto de escapar. Depois do rio havia outro bosque, ainda mais denso
que o anterior. Esperava poder se esconder nele até o outro dia.
Mas
uma trombeta tirou sua atenção. Um sopro forte, que anunciava a morte por onde
quer que passasse.
E do
bosque saíram os cavaleiros, vestidos em metal da cabeça aos pés. À frente
vinha líder, o general demoníaco que assombrava o imaginário popular desde o início
da guerra. Haviam ouvido todos os tipos
de rumores na taverna. Se metade deles fosse verdade, já estariam mortos.
Foi
conduzida por Crag para o outro lado da margem. Em solo seco outra vez, deu-lhe
um último beijo. Os cavaleiros pararam antes de alcançar a água.
-Não
faça, por favor... – Anekke choramingou,
quando percebeu o que Crag estava prestes a fazer. – Não, por favor! – Tentou
puxá-lo, mas não podia com a força do marido.
-Vá,
Anekke! – Crag tinha o machado em mãos. O velho machado que fora de seu pai, e
do pai dele antes. Que já rachara tanta lenha e derrubara um sem fim de árvores
ao redor do vilarejo. – Vou atrasá-los o que eu puder. Vá!
Mas
Anekke não se mexeu. Em parte porque não queria deixá-lo. Não poderia suportar
que ele ficasse para morrer sozinho.
E
também porque estava paralisada de medo, pela visão do homem que desmontara do
cavalo e se aproximava sozinho do casal.
Era
o general, o senhor da noite, sedento pela escuridão. Vira-o matar inúmeras
vezes naquele dia, ainda no vilarejo.
Ele
os perseguira pela mata. Obstinado, movido pelo desejo de matar e destruir. Deixara
seus homens do outro lado da margem e agora vinha para os exterminar.
Era
a sua natureza.
-Vá,
Anekke! – Crag gritou mais uma vez. Empurrou-a com força, quase derrubando-a.
Sentia o medo na voz do marido. Sabia que ele estava disposto a morrer.
O
general avançou na direção deles. Lentamente, como se saboreasse aqueles
momentos de terror. Tinha uma espada na mão, a mesma que derramara o sangue de
tantos mais cedo. Revestido de metal da cabeça aos pés, trazia a escuridão
consigo.
Ele
era a noite.
Crag
correu. Com o machado na mão investiu contra o general. Mas seu algoz era um perito
cavaleiro. Sua espada bloqueou o golpe com a facilidade com que lidava com uma
criança, e usou o punho da espada para acertar o rosto de Crag em cheio.
Viu
o marido cambalear, cuspir sangue e investir novamente. Viu o general brincar
com ele, e viu o restante dos soldados rirem do outro lado do rio.
Mais
um golpe, e mais uma vez Crag no chão. Seus olhares se cruzaram mais uma vez e
pode ler a palavra vá nos lábios do
homem que amava. Não podia deixá-lo.
Não
ia deixá-lo.
E,
dali, viu tudo acontecer. Viu o general arrancar o machado das mãos do marido e
derrubá-lo de costas. Viu-o pegar Crag pelos cabelos e colocá-lo de joelhos.
E
gritou, quando o homem conduziu a espada pelas costas do marido, fazendo-a sair
tingida de vermelho pela barriga. Viu a luz deixar os olhos de Crag, e sentiu
sua luz interior se apagar de repente.
O
homem estava morto. Não havia sido um oponente que tivesse valido a pena, pelo
menos não para ele. Em sua mão, a Destruidora de Eras sentia-se cada vez mais
saciada com o sangue de mais um inocente. Mas o homem havia sido um fraco, como
todos os outros. A mulher, de joelhos à sua frente, chorava.
Avançou
para pôr fim ao seu sofrimento.
Pegou-a
pelos cabelos, ao som de berros e deleitando-se no desespero dela. Ansiava por
sangue derramado. Já não sabia mais dizer se era a vontade dele ou da espada.
Ergueu
a arma, para dar o golpe que colocaria um fim ao último dos aldeões da região.
Sangue. A espada pedia por
isso. Ela tinha sede. Uma sede que nunca passava.
Desesperada,
a mulher agarrava sua mão, ainda aos prantos. Estava preste a matá-la quando
viu o anel em seu dedo anelar. Tão fino e brilhante, um pequeno anel de
prata...
...Idêntico
aquele que dera à Iona no passado, na outra vida. Aquela vida agradável sem
guerras ou espadas malignas. Ah, Iona.
Aquele sorriso. Suas mãos tocando as
minhas, sua boca...
Lembrava-se
de querer ser bom. De jurar protegê-la e amá-la para sempre. De...
...Quando
os assassinos chegaram à calada da noite, e cortaram-lhe a garganta. De seu
corpo sem vida no piso frio, o sangue formando uma poça vermelha e espessa...
...Iona...
A
espada caiu de sua mão. Pela primeira vez em anos dominou a vontade da
Destruidora de Eras. Lembrar-se de quem era ao lado de Iona fazia-o sentir
envergonhado, sujo. A mais breve lembrança de sua amada fazia querer desistir
da matança.
Desistir
da espada demoníaca e dos poderes que ela oferecia. Sentiu que agora podia.
Soltou
a mulher, que se desvencilhou assustada. Ajoelhou-se, enquanto ela se afastava
na direção do cadáver do marido. Mas não prestava mais atenção.
Pensava
apenas em Iona. A lembrança de seu sorriso a iluminar-lhe aquele dia de trevas.
Anekke
se arrastou até onde Crag estava. Morto. Não saberia dizer o que, de fato,
estava acontecendo. O general estava imóvel, ajoelhado, e de costas para ela.
Poupara-a, e jamais saberia o porquê.
Alguns
dos soldados do outro lado do rio começaram a desmontar. Avançaram, com
machados, espadas e maças.
Mesmo
que o general a tivesse poupado, os outros a matariam. Ou pior. Crag estava
morto e sentia que sua vida estava acabada, de qualquer jeito.
Fechou
os olhos do marido, e despediu-se dele com um beijo na testa. Eu te amo, Crag. Logo estaremos juntos
novamente.
O
machado estava quebrado, e de nada lhe serviria. Mas Crag tinha um punhal preso
à perna esquerda. Não era uma arma extraordinária, mas serviria para o que
estava prestes a fazer.
Estava
cansada, sim. Destruída espiritualmente também. Mas reuniu suas últimas forças
e engatinhou na direção do general, que parecia perdido para fora das
fronteiras do mundo. Os outros a matariam, é claro. Mas ao menos se vingaria do
homem que, por pura diversão, destruíra a vida deles.
Mate... Mate... Mate...
Era
o que a Destruidora sussurava em sua cabeça. Ouvia essa voz há anos, desde
quando a encontrou no fundo de uma masmorra. Agora a voz demoníaca ia dando
espaço à lembrança de sua amada.
Era
uma época mais simples, quando tudo o que queria era vingança. Vingança essa
que o arrastou para a guerra, e desde então lutara e matara mais do que
qualquer um antes dele.
Ah, Iona. Como eu a amo. Eu...
Mas
a visão de Iona balançava negativamente a cabeça. Em seus olhos, uma expressão
de profunda tristeza.
Eu... Não conseguiu
encontrar as palavras corretas. Não havia o que dizer. Iona desaprovaria sua
vingança, mas ela não entendia. Ela não...
Mate... Mate... Mate...
Cale-se! Sua
alma gritava, e pela primeira vez o homem dominou a espada demoníaca. Ou teria
tal homem se tornado um demônio? Cale-se!
Você serve a mim, Destruidora, e não o contrário!
Sentiu
o poder pulsando pelo seu corpo, tanto poder que chegava a dar calafrios. Tudo
o que poderia fazer com esse poder de agora em diante. Toda a destruição e o
caos.
Toda
a matança...
Mas
não queria mais. Lembrava-se de Iona e isso o fazia querer estar morto ao lado
dela, embora soubesse que depois de tudo o que fizera jamais a encontraria no
outro mundo.
Eu te amo, Iona. Sempre amarei...
Um
movimento às suas costas chamou sua atenção. Virou-se rápido antes que a mulher
do aldeão o atingisse com uma punhalada. Então todos os anos como general das
trevas falaram mais alto e, com um soco, derrubou-a.
Juntou
a espada como se fosse um ato involuntário. A lâmina ressoava com a energia das
almas de todos aqueles que mataram, espada e espadachim enfim se tornavam um só.
Sentia
aquele poder como nunca antes havia sentido.
Em mil anos, ninguém jamais dominou meu
poder. Era o que a Destruidora sussurrava agora. Eu o sirvo agora, general. Entregue-se à
matança! Ah... Estou com tanta sede...
Pisou
no peito da mulher caída, e ergueu a espada para desferir o golpe mortal, que selaria
de vez seu pacto com a Destruidora.
Se
matasse agora, desta vez seria para sempre.
Iona,
em sua mente, desaprovava. Mas ela não
entendia. Jamais entenderia.
E a espada
desceu.
E
tudo o que Iona um dia simbolizara, morreu junto com Anekke.
****
Hey, aprendizes! O que acharam do conto? Sintam-se à vontade para deixar sua opinião, juro não contar pro general...
Este conto foi baseado no videoclipe da música General of the Dark Army, da
banda canadense de heavy metal Unleash the Archers. A música faz parte do álbum conceitual Demons of the Astrowaste, ou seja, faz parte de uma história mais longa e muito interessante.
O conto que você leu não é uma releitura fiel nem se encaixa na história do álbum. Trata-se apenas de um tributo, uma homenagem à boa música. E consegui autorização da banda para isso, através de mensagens pelo facebbok.
Não consegui colocar o vídeo aqui, então segue o link:
O conto que você leu não é uma releitura fiel nem se encaixa na história do álbum. Trata-se apenas de um tributo, uma homenagem à boa música. E consegui autorização da banda para isso, através de mensagens pelo facebbok.
Não consegui colocar o vídeo aqui, então segue o link:
General of the Dark Army Official Video
Para saber mais sobre essa banda incrível, visite a fan page official no facebook!
O som deles é muito bom, heavy metal de verdade e com muita qualidade, então bora lá ouvir!
Ok, você PRECISA continuar isso 😉
ResponderExcluirValeu, Miguel, Obrigado pelo apoio!
ResponderExcluirCara, não POSSO mais escrever sobre isso. Embora eu tenha dado alguns toques pessoais, a ideia básica não é minha. Muitas da situações são exatamente como no videoclipe, e vale a pena dar um conferida no material original!
E também gostaria de dizer que fiquei satisfeito com o conto, apesar de algumas críticas negativas que recebi. Sinto que narrei a história que queria, e deixei muitos arcos em aberto justamente para o leitor preencher as lacunas que achar necessário.
Sempre há espaço para melhorar, eu sei. E por isso as críticas são muito importantes.
Obrigado pelo apoio, mais uma vez,
E um forte abraço!